Apresentação realizada no dia 11 de novembro de 2016, no Museu Espaço dos Anjos, em Leopoldina, MG
COLHEITA
Autora: Helenise de Mello Bisaggio
(Juiz de Fora/MG)
Pseudônimo: Lustral
Intérprete: a autora
Debaixo dos galhos retorcidos.
Difícil parturição!
Mãe despeja germe humano.
Na terra tórrida do sertão.
“- Pai, manda chuva!”
Todo ano era assim:
- A seca, a desgraça, o aborto...
“- Virgem Mãe, manda chuva!”
“- Vingou! Dessa vez vingou, em um sequinho corpo!”
“Kara Wã! Kara Wã, esse nome vai chamar.”
Vai precisar de resistência.
Vai ter muito o que rezar.
É o terço na mão, joelho no chão, penitência...
Cresce Kara Wã naquele Torrão natal.
Semeando grãos nas areias do torpor.
Regando dia-a-dia com lágrimas do coração.
Colhendo depravação, pungência, dor.
Na mesmice de sangrar todo mês.
Sem nenhuma ararinha a fazer ninho em sua cabeça.
E no meio daquela escassez, o destino...
O destino empurrava-lhe o mesmo enredo da mãe, até que o
mesmo
aconteça.
“-Pai do Céu me socorre!”
O grito de gozo escoava.
Escarranchada debaixo da umburana.
Ali, a um chegado parente se entregava.
Sem parecença. Em condição subumana.
Da pele vermelha como folhas no caroá.
Frita de sol, ferida pelos espinhos em tão tenra idade.
Com a mesma saga da mãe.
Enterra na terra seca, os frutos da mocidade.
Útero, quase sempre, é colheita certeira!
Naquele lugar, única terra que semente medrava.
Kara Wã! Fertilidade no infortúnio.
A colheita de muita mulher brasileira.
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